Era inevitável que o problema das manifestações que paralisam essa via com uma frequência cada vez maior ocupasse posição de destaque nas discussões promovidas pelo “Fórum Pensar Avenida Paulista 2021”, promovido pela Associação Paulista Viva, com o apoio do Estado. Ela não é mais apenas a avenida símbolo de São Paulo. Tornou-se também o símbolo da sem-cerimônia com que grupos, os mais diversos, se arrogam o direito de ocupar ruas e avenidas da cidade, a qualquer dia e hora, para manifestações que pisoteiam os direitos de ir e vir do restante da população, sob as barbas de autoridades amedrontadas.
Dados da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Estado de São Paulo (ABIH-SP), apresentados durante o fórum por seu presidente, Bruno Omori, indicam que as grandes manifestações de junho, das quais a Paulista foi um dos pontos principais, foram responsáveis por prejuízo de R$ 12 milhões apenas ao setor hoteleiro. Em junho, segundo ele, sete de cada dez eventos corporativos agendados para os hotéis localizados na avenida e adjacências foram cancelados. Em alguns casos, o cancelamento chegou a 100%.
Esse tipo de prejuízo, facilmente mensurável e referente a um período particularmente difícil, é apenas um exemplo do que a ocupação selvagem e a qualquer pretexto da Paulista causa a cerca de 1,5 milhão de paulistanos que por ela passam todos os dias. Há outros, referentes aos aspectos os mais variados da vida e das atividades dessas pessoas, que somados são muito mais importantes que o da hotelaria. É tempo perdido no trânsito, são negócios que deixam de ser feitos, compromissos cancelados, pacientes que não conseguem chegar aos hospitais da região – uma dezena, entre os quais o Hospital das Clínicas, que atende pessoas de todo o País – e daí por diante.
O problema das manifestações na Paulista, que vem de longe, agravou-se nos últimos meses. Hoje, qualquer meia dúzia de gatos-pingados – e não vai nisso nenhum exagero, como sabe qualquer paulistano minimamente informado – pode parar a Paulista a qualquer momento e pelo tempo que quiser. Fazem isso alegando o direito de manifestar suas opiniões e apresentar suas reivindicações, que ninguém contesta. Só que esse e os demais direitos não são absolutos, têm de se harmonizar com os outros. É o velho princípio, mais do que conhecido e universalmente aceito, segundo o qual o direito de cada um termina onde começa o direito do outro, e o mais elementar é o de ir e vir.
A solução proposta por outro participante do fórum, o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP, Martim de Almeida Prado, é regulamentar a maneira de fazer os protestos, com base em discussões com a sociedade, por meio de audiências públicas. “O governo deveria regulamentar, em lei, como as manifestações poderiam ocorrer. É certo que a Paulista não pode receber todos os atos da cidade. Direito é limite e direito de expressão não pode ir contra o direito da coletividade”, diz ele.
A rigor, isso não é necessário, porque o poder público já dispõe de condições para impor disciplina às manifestações que, tal como ocorre nos países desenvolvidos da Europa e nos Estados Unidos, devem obedecer a regras estritas: comunicação antecipada às autoridades e determinação de local e hora. Alguém coloca em dúvida, por isso, o respeito à ordem democrática nesses países? Uma lei específica sobre isso, para tornar as coisas ainda mais claras, pode até ajudar, mas o fator decisivo será sempre a firme determinação das autoridades de fazê-la respeitar e coibir os abusos. De que adiantará ter um contingente específico da Polícia Militar para cuidar das manifestações, como anunciou durante o fórum o seu comandante, coronel Benedito Roberto Meira, se ele, como acontece hoje, não agir com firmeza para garantir a manutenção da ordem?
Acabar com as manifestações selvagens, que atropelam os direitos da esmagadora maioria da população da cidade, é condição essencial para planejar o futuro da Paulista até 2021. Ou se faz isso ou a Paulista, mais do que símbolo da cidade, será símbolo da anarquia.